O cinema ao longo das décadas passou por inúmeros processos de desenvolvimento/evolução, sendo por conseguinte, um reflexo do seu tempo. Seja o cinema clássico, moderno e o pós-moderno, o cinema fala sobre seus contextos culturais, sociais, políticos e industriais. Seria, então, certo dizer que vivemos a era do “pós-pós-modernismo”? O cinema pós-moderno é um cinema obcecado por suas heranças, ou seja, os cineastas assumem a história como verdadeiros ladrões, roubando como artistas, fazendo um cinema de referências – históricas e formais.
Mas o que seria essa ideia (estranha) do “pós-pós-modernismo cinematográfico”? Bom, se no pós-modernismo nós temos um cinema de referência, aqui nós temos filmes que estão muito mais preocupados em padronizar (como uma fórmula) as suas histórias, e “universalizar” essas obras, para que elas façam sentido em um todo, mais do que em si mesmas — essa ideia surge a partir da concepção do universo cinematográfico Marvel, que foca muito mais em entrelaçar suas obras e narrativas.
Esse cinema “pós-pós-moderno” aproveita-se do poder que a nostalgia tem, não à toa, estamos vivenciando muitos retornos de obras clássicas ou de personagens que carregam uma infinidade de fãs. Sendo assim, Transformers: O despertar das feras traz essa ideia cinematográfica (que não tem embasamento teórico nenhum, apenas uma reflexão minha) beneficiando-se de um “algoritmo” que entende o que o público quer — sejam “grandes” efeitos especiais, realidade na fantasia, ação unido ao humor e/ou muito dinamismo. Percebe-se, portanto, uma automatização, dessa nova era do cinema.
Por mais que essas produções caiam na genericidade, muitos autores sabem aproveitar do genérico provando que quando nas mãos de um diretor que “sabe” de cinema e, principalmente, entende como a indústria funciona, podem ter ótimos resultados. Transformers: o despertar das feras, portanto trabalha com o (pouco) que tem de melhor do “pós–pós-modernismo”, unindo muito bem aventura, humor e ação.
Os últimos filmes dessa franquia tiveram grandes problemas na concepção de seus núcleos narrativos (humanos e robôs), havendo uma discrepância bastante significativa que desconecta o espectador da imersividade. Destarte, O despertar das feras consegue equilibrar muito bem esses núcleos, a título de exemplo, os humanos são extremamente carismáticos e trazem um peso dramático interessante para a narrativa, não sendo um fardo como foram nos últimos longas da franquia.
Na realidade, o desenvolvimento dramático dos personagens é um dos pontos mais legais do filme, onde temos protagonistas com certa complexidade, tal como o Optimus Prime. Aqui vemos o líder dos Autobots de uma maneira diferente do que estamos acostumados, um Prime mais carrancudo e existencial, que coloca o peso do mundo em suas costas. A forma como o diretor opta por demonstrar esse sofrimento do Optimus de uma maneira comportamental (frieza, rigidez e violenta), aproximando a câmera dele, faz o espectador criar um laço de identificação pelo líder. Eu diria que essa comunicação afetiva entre personagem-espectador está muito bem estabelecida no filme, todos os heróis são admiráveis, enquanto os vilões são desprezíveis.
Um problema desse cinema epopeico está muitas das vezes em como o diretor filma a ação, mas Steve consegue trazer o épico para tela de uma maneira limpa, a câmera passeia e se movimenta bastante (dinamismo característico) entre os combates, sem desconectar quem assiste. Além da boa ação, o humor é diversão garantida, tudo na medida certa, sobretudo quando Mirage e Diaz interagem entre si.
O maior problema em Transformers: O despertar das feras está justamente na principal característica do cinema “pós-pós-moderno”, que seria universalizar tudo que faz, parece que nada foi feito para funcionar como algo único. A cena final (pós crédito?) onde eles apresentam um crossover inusitado, parece-me uma atitude desesperada de tentar atrair a massa de fãs.
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